domingo, 25 de dezembro de 2011

Turismo no Rio



Domingo, 25 de dezembro de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


     A melhor coisa do mundo é ser turista no Rio. Eles/elas chegam trazendo uma sacola com 2 bermudas, 5 camisetas, um biquíni, uma sandália de borracha, um boné, acordam cedo e saem para conhecer a cidade _ e que cidade.
     Um dia vão a Santa Teresa, o bairro mais charmoso que existe, e andam a pé, vendo casas lindas, descobrindo ruelas sem saída, parando várias vezes para comer um pastel, tomar um caldo de cana ou uma cerveja gelada, e conhecendobotequins e restaurantes que quase nenhum carioca conhece, só eles.
     O problema é a escolha: podem caminhar na pista Claudio Coutinho, que faz a volta do Morro da Urca, depois aproveitar a viagem e subir ao Pão de Açucar para ver a vista mais deslumbrante que existe. É um programa que nãopassaria pela cabeça de nenhum carioca fazer; eles acham brega, não sabem o que estão perdendo. E outra breguice maravilhosa é subir ao Corcovado, e na descida se aventurar pela floresta, com direito a um banho de cascata para refrescar. E pense: qual a grande cidade tem a sorte de ter uma floresta de verdade tão perto? Se estiver de carro, pode voltar pelo outro lado, descer direto na Barra, e escolher em que ponto dos muitos quilômetros de praia vai dar um mergulho.
      Vai poder também visitar o Sitio Burle Marx, e se extasiar com as centenas, milhares de plantas tropicais; depois,almoçar em um dos restaurantes das “tias” ali perto, em chão de terra batida, comer um camarão fresquinho, um peixe acabado de pescar, pagando 3, 4, 5 vezes menos do que num restaurante chique. E dar uma volta no Jardim Botânico, lembrando que era o lugar preferido de Tom (Jobim, claro), e se deixar levar pela memória, pensando nas músicas que o maestro compôs, muitas delas inspiradas por ali.
      Mas o Rio tem mais, muito mais.
      Um mercado de artesanato: quem não gosta? E não é programa obrigatório, quando se visita um país exótico? Pois aos domingos temos um, maravilhoso: é a feira Hippie, na praça General Osório. Lá você compra por 10, 20 reais, as pulseirinhas mais lindas, que estão nas vitrines das butiques por 100, 150, e mais colares e brincos, bolsas que vão fazer furor na volta para casa, calças compridas, blusas, pareôs, tudo bem baratinho, como a gente gosta, ainda com direito a comer um acarajé feito na hora por 6,50 (só os cariocas não vão à feira). Depois das compras feitas, mais um mergulho para arrematar o dia, e detalhe: a praia é a dois passos.
     Como moro no Rio, não costumo seguir esse roteiro, mas no fim de tarde faço como eles: boto um tênis e ando até o Arpoador. Na volta, paro num quiosque, tomo uma água de coco _ 4,00 _, fico vendo o sol se esconder atrás do morroDois Irmãos, e a cada vez levo me surpreendo com a beleza. Só vou para casadepois que escurece, mas eles, os turistas, continuam: como se fosse mágica, rola um som, a caipirinha aparece, e a festa continua até de madrugada.
     Ah, se eu fosse esperta mesmo, nas próximas férias iria para um hotel na frente do mar, me fantasiaria de turista e aproveitaria melhor a cidade onde tenho o privilégio de morar.
     PS – O governo do Rio é muito criativo; como, durante as obras do metrô, algumas ruas serão  fechadas ao trânsito _ o que vai impedir os moradores de ter acesso às garagens _, manobristas estarão à disposição para cuidar dos carros, não é lindo? E aproveitando: será que o visual das novas estações do metrô não podia melhorar? A da praça General Osório é monstruosa, e dá medo só de pensar que podem fazer algo parecido na linda Praça N.S. da Paz.

domingo, 18 de dezembro de 2011

ELAS & ELAS



Domingo, 18 de dezembro de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo


Outro dia fui parar na Lapa, o lugar mais animado do Rio. Como a rua do Lavradio, onde se concentra a grande animação, é fechada aos carros, as mesas ficam nas calçadas e até no meio da rua, e às 8h a festa já bombava (o carioca inventou uma moda ótima: agora as confraternizações de fim de ano começam nos primeiros dias de dezembro, e éfesta o mês inteiro).
         A Lapa é democrática; tem de tudo, mas a grande maioria _ dá para ver _ é de pessoas simples, que saem do trabalho e vão ali tomar um chope, se divertir, lá o que mais tem é alegria. E quando a música _ ao vivo _ ataca, as mulheres vão para a pista de dança, e se não tiverem com quem, dançam sozinhas.
         Primeiro, o visual: quase nenhuma é magra, como ditam as modas. Umas são bem gordinhas, e não parecem estar minimamente preocupadas com o assunto. Usam roupas coladas no corpo, grandes decotes, barrigas de fora, saias curtíssimas, não se importam nem um pouco de mostrar as pernas _ com ou sem celulite _, e os pneuzinhos de cada lado da cintura; elas não estão nem aí. Essas moças, que não são especialmente lindas, e devem viver de salário _ um salário pequeno _, têm uma coisa invejável, que raramente se vê em moças magras, elegantes e ricas: a alegria de viver, o prazer de se divertir. E bom mesmo é ouvir as conversas, quando vão ao banheiro retocar a maquiagem.
         Sempre sorrindo de orelha a orelha, elas falam: “ele que me aguarde, não estou nem aí, homem é o que não falta”, é o mínimo que se escuta, e aí emendam com um “quando sair daqui vou para um samba na Dutra”. Para quem não sabe, a Dutra é a estrada que vai do Rio a São Paulo, e o mantra dessas moças tão felizes parece ser o “não estou nem aí”.
         Conheço muitas jovens magras, elegantes e ricas, infelizes porque estão 2 quilos mais gordas, porque o cabelo não foi cortado direito, porque o namorado sumiu e, por essas razões gravíssimas e outras, tão graves quanto, inseguras. Nos banheiros das casas noturnas chiques, o mais frequente é ouvir uma se lamentando, arrependida por não ter usado outro vestido (o que está usando engorda), outra contando que já marcou o dia de aumentar os seios, para curtir o verão, e todas, sempre, olhando o celular para ver se “ele” tinha aparecido; e segunda-feira, tome de analista para se queixar da vida.
         E nas praias? Que seja em Ipanema, Salvador ou Santos, se a maioria das frequentadoras desse importância a essas coisas, passaria o verão (e a vida) trancada num quarto escuro. O que mais se vê são moças fora de forma, segundo os conceitos atuais, mas totalmente à vontade, alegres e felizes, dando seus mergulhos, e provavelmente achando Giselle Bundchen _ quem mesmo? _ uma magrela. Esse “não estar nem aí” é a segurança que tantas procuram; elas não olham as páginas de moda, não sabem que uma mulher não pode _ segundo foi decretado _ ter mais de 90 de quadris, não sabem o que é fashion, nunca ouviram falar de dieta, nem sabem o que é a Daslu.
         E como não sabem, têm a liberdade de usar short de lycra, unhas compridas com esmalte bem colorido, boca vermelha brilhando, e se o namorado sumiu não estão nem aí, claro, pois o tempo que têm para se divertir é entre a noite de sexta e a manhã de segunda, quando acordam muito cedo para pegar no batente, então o lance é aproveitar a vida.
         Não sei se elas são mais felizes do que as outras, mas que se divertem muito, mas muito mais, disso não tenho a menor dúvida. 

domingo, 11 de dezembro de 2011

Dá para sonhar




Domingo, 11 de dezembro de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo

Foi dada a largada para as festas, e de todos os lados se ouve o mesmo refrão: “ah, mas que chatice, odeio Natal, estou louca/o para chegar logo janeiro e tudo isso tiver acabado”. Alguns já compraram a passagem, estão viajando uma semana antes, para disfarçar que estão fugindo, e só voltam em 2012 _ e é por isso que não se encontra mais lugar em nenhum avião para nenhum destino.
       Já passei noites de Natal em casa de amigos, e elas são, sempre, rigorosamente iguais: as mesmas comidas, o mesmo troca-troca de presentes, as luzinhas da árvore piscando, piscando, as mesmas pessoas de todos os anos repetindo o mesmo texto _ Feliz Natal _, mas ficando pouco tempo, pois tinham pela frente outras festas espalhadas pela cidade, da sogra do irmão, da mãe do futuro genro, etc. etc., nessa loucura que são hoje as novas famílias.
       Mas ouço falar que existem os que curtem de verdade; não sei se pelo lado religioso _ será? _ ou pelo lado familiar. Há os que cruzam os oceanos, para poderem estar todos juntos e unidos nessa noite, e para esses o Natal começa em setembro, outubro. É quando combinam em casa de quem vai ser a ceia, quem leva o que, e começam as compras: presentes, papéis de embrulho, laços de fita, e os enfeites, os famosos enfeites da árvore, que a cada ano deve surpreender por ser maior e mais bonita que a do anterior. E o Papai Noel? Sempre haverá um herói na família para, num calor absurdo, se vestir de bom velhinho, com direito a peruca, gorro, barba e bigode. Onde se compra a roupa de Papai Noel? Mistério. E será que alguma criança ainda acredita em Papai Noel? Outro mistério.
       Mas as datas têm um peso, e os que não têm família _ ou acham que o Natal não tem nenhuma importância, é um dia como qualquer outro _, estão sujeitos a uma certa melancolia (e alguém encontra um analista dia 24 de dezembro?). Esses ligam a televisão e olham para o relógio a cada 10 minutos, para ver se já está na hora de poder tomar um tranquilizante, dormir, e só acordar dia 25 com um ufa!, já passou. Mas ainda tem o 31.
       Nessa noite é obrigatório ser feliz, e ai de quem estiver só, curtindo um amor que se foi ou lembrando das tristezas do ano que passou. E quanto mais alegres estiverem as pessoas nas ruas, mais fogos forem estourados para festejar 2012, mais sós e tristes vão se sentir. Não adianta o discurso de que é um dia como qualquer outro, porque não é; a pressão é grande, dela poucos escapam.
       E é inútil tentar brigar com o mundo; ainda é tempo de se organizar, combinar com amigos, aqueles que estarão tão sós quanto você, e combinar de passarem juntos a famosa data. Para isso, o ideal seria ter um bom ar condicionado, alguma bebida, muito gelo, e _ por que não? _ uma travessa de rabanadas, mas com afirme intenção de achar tudo normal. É claro que à meia-noite vão haver muitos beijos e abraços, muitos votos de feliz ano novo, mas é rápido, pronto, acabou. E atenção: beba com moderação, pois as ressacas do primeiro dia do ano costumam ser colossais, e podem ser confundidas com depressão; aliás, alguém já viu uma ressaca feliz?
       No fundo, bem lá no fundo, dá uma inveja danada dos que acreditam e festejam o Natal e o Ano Novo a sério; estas devem ser as pessoas mais felizes do mundo, mas por que não tentar entrar no clima e pensar que o novo ano vai ser maravilhoso, e que vamos ser felizes para sempre?
       Afinal, sonhar não custa.



segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O que será que será ?



Domingo, 4 de dezembro de 2011, por Danuza Leão, para a Folha de S. Paulo



Quando uma mulher e um homem se vêem pela primeira vez, pode acontecer uma faísca; é quando bate.

Ela surge de uma imediata e inconsciente avaliação de parte a parte; pode ser com o cunhado, o feirante, o padre, o marido da maior amiga, e independe de beleza, charme ou classe social.

Essa estranha sensação pode não dar em nada, mas quanto mais intimidade você tiver com você mesma _ e com seus pensamentos _ mais rapidamente vai perceber o que está acontecendo, o que, aliás, é raro; a maioria das pessoas não identifica o que sente, até porque essa avaliação passa por uma fina peneira de censuras mentais _ morais e sociais.

Desde que a pessoa seja do outro sexo _ ou do sexo que lhe interessa _, perigo existe. É difícil botar em palavras sensações, mas tudo parte dessa faísca ser positiva ou não. Se ela não acontece, nem se pensa no assunto; mas se é positiva e se tem tempo e coragem para brincar, a fantasia pode ir longe. Se estiver tomando uma bebida, aí então ela é ilimitada.

Algum dia você largou seu freio de mão mental e deixou sua imaginação livre, como devem ser as imaginações? Vamos admitir: é difícil. E as convenções sociais, e os preconceitos, e o medo? Como aprendemos que se peca até em pensamentos, brecamos a maioria deles e depois não sabemos porque nossa cabeça é um nó. Mas se deixarmos eles correrem soltos será que as coisas ficam mais fáceis? Há quem diga que sim.

Logo no primeiro olhar fica definido se o outro é ou não possível. A sensação não precisa ser recíproca, mas quandoacontece, é imediatamente percebida pelos dois. Estabelece-se então uma energia que faz com que esse momento seja diferente, especial; o corpo fica tenso, o olho brilha, e você sente o prazer supremo, que é o de se saber viva.

Para alguns isso nunca acontece, e existe quem nunca soube, nem nunca vai saber, do que se trata. Já com outros, acontece até no leito de morte; basta entrar uma enfermeira gostosa, que a corrente se estabelece. Atenção: essa eletricidade é contagiosa, por isso tantos passam a vida sendo desejados, enquanto outros sofrem de um incurável desinteresse do sexo oposto.

Os mais corajosos, quando têm consciência do que está acontecendo, se deixam levar; aí começa o perigo, que para a mulher é sempre maior. Um homem que segue seu impulso e arrasta com ele alguém de classe inferior, digamos, é sempre compreendido _ até porque elessabem até onde podem ir. Já se a mulher tiver um caso com um motorista de caminhão, será um escândalo (fora que elas têm a mania de se apaixonar, o que faz toda a diferença). Aliás, pense nas coisas que devem acontecer coisas na vida de nossos amigos mais íntimos, e que nem podemos imaginar.

O tema é interessante, aliás, interessantíssimo, e vale sempre a pena saber a quantas se anda; se está viva ou se respira ligada nos aparelhos, que são a educação, a moral, a religião e os bons costumes.

Sendo assim, por mais que uma mulher seja um poço de virtudes, é temerário que ela fique perto de qualquer homem, porque homem e mulher, quando se juntam, ninguém sabe o que pode acontecer.
Esse é o perigo, e a graça. É a pulsão da vida.